11 de set. de 2006

O dia em que o mundo caiu

Em 10 de setembro de 2001, estava eu atrasado para chegar ao local de trabalho. Nessa época, eu era responsável por resolver problemas que sempre surgem depois de obras, principalmente um cabeamento estruturado, no prédio da Embratel da Presidente Vargas. Posso admitir chegar atrasado a um encontro pessoal, mas odeio passar da hora em que deveria estar no trabalho, por isso resolvi pegar um ônibus e depois o metrô, para tentar chegar a tempo. O problema é que na calçada estreita havia um par de velhinhas que caminhavam beeem devagar, para minha irritação mais que óbvia. Decidi sair da calçada, ir pela rua, e já livre delas ia subindo de novo na calçada, só que resvalei no meio-fio e caí de tal maneira espetacular que estive quase na horizontal, com todo o peso do meu corpo, que já não era pouco na época, sobre meu pé esquerdo. Ainda subi a rampa, depois de ser ajudado pelas simpáticas e assustadas velhinhas, porque ainda estava caliente. Mas não demorei a me dar conta que havia quebrado o pé. No dia seguinte, já em casa para uma temporada de 45 dias de monotonia, interrompiam os desenhos animados que eu assistia para falar do que em princípio era um acidente bastante bizarro. Enquanto eu voltava da cozinha, minha mãe me falava de uma avioneta que havia chocado com uma das Torres Gêmeas. Eu olhava aquilo e pensava, caramba, e fez tudo isso? Logo, explicaram tratar-se de um Boeing. Seguramente, eu devo ter dito, “se fosse no Brasil, seríamos rebaixados para o 4º Mundo”. De repente, mostravam o que parecia ser a repetição. Tardei uns quantos segundos até entender que era um outro avião. Tudo aquilo parecia um filme-catástrofe de segunda categoria. Confesso que, no momento, ainda não estava chocado, talvez porque a surpresa, o inusitado da situação, fosse predominante. Não pensei nas pessoas que estavam nos aviões, chegando para uma reunião de negócios, para reencontrar a família, para começar uma nova vida, ou para conhecer a cidade que nunca dorme, nem naquelas que estavam trabalhando e em questão de segundos foram desintegradas. Eram pessoas que podiam estar falando ao telefone, tomando um cafezinho para relaxar, tendo uma discussão por erro bobo, pensando na discussão do dia anterior com a pessoa amada e tentando encontrar uma maneira de resolver a situação ou, simplesmente, estavam no banheiro. Hoje faz um dia feio, meio que rançoso. Como se não bastasse ser uma segunda-feira, este é um 11 de setembro. E mesmo que não vivêssemos na era da mídia invasiva e exagerada, em que obrigatoriamente vamos recordar durante toda a semana o que passou naquela manhã, como esquecer isso?

Para mim, este feito equivale à queda de Constantinopla, que é simbolicamente traduzida como o fim da Idade Média. Curiosamente, também simboliza o fim de um império que se creia invencível – o Romano – e tem como protagonistas os turcos, seguidores de Alá, assim como Bin Laden. No entanto, devemos recordar que a invasão à Constantinopla foi o que chamamos popularmente de “bater em bêbado”. No caso norte-americano, eu arriscaria dizer que esse é o começo do fim de sua hegemonia mundial. Não que derrubar um par de arranha-céus seja suficiente para isso, claro que não, mas ocorreu justamente em um momento em que os Estados Unidos eram (e ainda são) governados por um homem de baixa estatura política, pouco respeitado mesmo pelos seus e metido a cowboy, que pensa que a solução de todos os problemas tem a ver necessariamente com posar de macho-alfa, mostrando quem manda no pedaço. Absolutamente não justifico o que passou nesse dia, mas não teria sido mais inteligente fazer uma auto análise e tentar descobrir o por quê de estarem sofrendo atos insanos como estes? Bush, sem dúvida, perdeu a grande oportunidade de criar um momento conciliador entre Ocidente e Oriente, tornado sem efeito prático a loucura perpetrada por Laden e seus capachos. Claro que a dor das famílias de todos os que foram vítimas jamais poderia ser apagada, nunca o será, mas multiplicar a dor e a miséria, prender irregularmente gente que eles considerem suspeitos e interferir na soberania além-mar, tampouco servirá para essas pessoas. Menos ainda para o mundo. Infelizmente, ou talvez tenha sido por isso, Laden encontrou em Bush sua alma gêmea fundamentalista. Quem perde somos nós, que não temos nada que ver com isso. E porque acho que é o começo do fim estadunidense? Notem como a já famosa antipatia ao Tio Sam, cresceu nos últimos 5 anos. Seus aliados foram se afastando, saindo à francesa. Sobraram, por enquanto, Grã Bretanha e Israel. Por maior que seja a supremacia militar americana, o que faz sempre diferença é a grana que gira as engrenagens mundo afora. As novas tecnologias que serão as responsáveis por diferenciar quem manda e quem obedece não são apenas dominadas pelos EUA. Cingapura já domina bastante bem a clonagem terapêutica. Argentina tem um organismo somente para fomentar projetos de nanotecnologia. Brasil há anos pesquisa fontes alternativas de combustível. Não digo que nosso filhos terão tempo de ver um novo equilíbrio mundial, mas acho que seus filhos, sim. E o próprio cidadão americano começa a desejar isso, talvez sem saber, pois a cada dia eles questionam mais e mais a linha de ação do governo Bush. Não morreram gerações inteiras lutando por construir um país para que seja destruído assim. Para terminar, algo que sempre me intrigou: Spielberg recentemente filmou Munich, que trata do assassinato de onze atletas israelenses durante as Olimpíadas de 1972 e que foi assumido por um grupo chamado Setembro Negro. Coincidência?

Cuidem-se, tenham uma boa semana.

7 de set. de 2006

Verde-amarelo

Eis que hoje comemoramos nossa mudança de donos, mais conhecido como Dia da Independência. Sobre essa estória do dia da Pátria, me lembro que distribuíam aviõezinhos coloridos, chapeuzinhos, sempre encenávamos na escola o famoso grito de D. Pedro, levantando a espada (coisa que, nessa época, ele fazia muito). Sinceramente, não sinto falta desses dias. Era criança, mas tinha consciência da hipocrisia, além dos tanques, que nos cercavam. O mais triste disso tudo é que ninguém lutou por nada, o que nos ensinam é que nosso imperador espada deu um grito, os portugueses se assustaram e, pimba!, éramos livres. Queria muitíssimo que alguém me explicasse como foi que tudo aconteceu realmente. Se bem que, se nos dias que seguem é difícil explicar tim-tim por tim-tim tudo que sucede nos porões de Brasília, imaginem o que passou há quase dois séculos.

A história de independência argentina pelo menos é mais bonitinha. Até hoje não sei qual data é a mais importante, 25 de maio ou 9 de julho. Bem verdade que depois da independência nem tudo foram rosas, a unificação do país foi conseguida a muito custo (aposto que vocês não sabiam disso), depois os aproveitadores de sempre saquearam o país, mas pelo menos tem uma história bonita por detrás, ainda que haja no meio disso tudo coisas bem feias, como escravos que lutavam na infantaria – o que explicaria a quase total ausência de negros por aqui. Uma pequena digressão: vocês já pararam para pensar nisso? Por que na Argentina não existem negros nativos se muitos deles foram contrabandeados para cá, vindos do Brasil? Apesar de que era proibido, os navios paravam em Buenos Aires com a desculpa que precisavam fazer algum tipo de manutenção, nessa os escravos sempre escapavam, veja só. Fim da digressão.

Não estou querendo dizer com tudo isso que somos piores que os argentinos, obviamente, até porque claramente existe uma tendência ao exagero tanto como no Brasil para descrever as glórias do passado (e, se foi tão bom, por que somos o que somos agora?). Mas é inegável que posso recordar facilmente alguns nomes importantes da história de independência platina: Belgrano, San Martin, Artigas... Na verdade, diga-se, lutaram pela independência da região inteira, incluindo Peru, Bolívia, Paraguai, Chile, Venezuela, etc. No final das contas, a Argentina hoje poderia ser quase do tamanho do Brasil ou até maior, sem falar no Uruguai que, na verdade, pertencia ao território argentino e foi transformado em independente com uma canetada, fruto de acordo entre Brasil e Argentina. E aí, o curioso leitor pergunta: então, o que deu errado? O de sempre: gente incompetente ou mal intencionada destrói o que, com muito esforço, outros lograram construir. Cada dia que passa, mais me convenço que as diferenças entre Brasil e Argentina não vão muito além da língua...

Besitos.

¿Hablas español?

Aproveitando o gancho do último post, pensei que seria interessante falar um pouco de algo que praticamente deixei passar em branco até agora: a barreira do idioma. À primeira vista, espanhol é fácil de aprender. Lembro bem quando me preparava para a minha primeira viagem a Mardel, neste momento tão somente por férias, e havia uma piada recorrente inventada por Rafael, em que eu teria que traduzir do carioquês para o castelhano, a singela compra de uma Coca: “Me mira una Cueca-Cuela”. Claro, era um exagero nosso, mas quantas vezes não caímos na tentação de falar ou escrever assim em espanhol? Assim, automóvel seria automueble, por exemplo. Curiosamente, pimenta seria pimienta, mas a gente costuma cair no erro de pensar que é o mesmo que em português. Nem falar da troca de gêneros: o leite, no Brasil, vira la leche. Já as pobres árvores deixam ter a graça feminina para transformar-se em garbosos machos a quem chamamos LOS árboles. Mais engraçado e causador de embaraços eternos são as palavras homônimas (ou quase). Aliás, em se tratando de embaraços, deixar uma mulher embaraçada em português não é muito agradável, mas posso garantir que deixar uma mulher embarazada, sem haver pensado nisso, certamente vai te deixar preocupado durante os 9 meses que venham. E se eu oferecer gentilmente ao cavalheiro segurar seu saco enquanto se senta (ops), por favor, não pense tratar-se de um assédio sexual, tampouco duvide de minhas preferências, simplesmente me refiro ao casaco. Um conselho final: jamais, jamais!, queira fazer um galanteio usando a palavra concha, ou sofrerás as conseqüências...

Um fenômeno que passa comigo é que às vezes misturo os idiomas, inserindo uma palavra em português quando falo ou escrevo em espanhol e vice-versa. É estranho porque jamais tive esse problema com inglês. Outras vezes, invento palavras, como vergüenha, mistura de vergonha com vergüenza. Mas a sensação mais estranha de todas é quando percebo que meu interlocutor está tratando de adivinhar de onde sou: já fui americano, português e até francês (este, certamente por causa da gorra que uso SEMPRE no inverno). Uma vez, comprando créditos para o cartão do ônibus, me disseram thank you. Mas nem posso reclamar muito, várias vezes vendi perfumes (na rua!) simplesmente por ser brasileiro. Chega a ser comovente quando vejo os olhinhos das pessoas brilhando e perguntando o que, afinal de contas, estou fazendo aqui! Como pude sair de um lugar tão bom, caloroso, onde as pessoas são felizes, pra estar em um lugar tão frio, e com isto não querem se referir apenas ao clima. Percebo claramente que nessas ocasiões as pessoas se sentem um pouco especiais porque, depois de tudo, se um estrangeiro escolhe a Argentina pra viver, significa que aqui não é tão ruim, certo? Também houve uma ocasião, enquanto eu falava com a amiga de um colega do trabalho, em que percebi um olhar meio estranho que me deixou meio embaraçado (felizmente desembaracei em seguida). Depois, o tal amigo veio me dizer que ela pensou que eu fosse japonês ou chinês... Com esta pérola, fico por aqui.

Cuidem-se todos, força sempre!