26 de abr. de 2006

Ô, Cride, fala pra mãe...

...que tudo que a antena captar meu coração captura. Essa canção dos Titãs se tivesse sido gravada por David Byrne com produção e arranjos mais caprichados teria virado clássico do rock alternativo, seguramente. Basicamente, o que ela diz é que a gente se acostuma com qualquer porcaria que passa na TV e ainda quer mais. Eu sou exemplo vivo disso! Na Argentina, existe uma quantidade de emissoras de TV similar à do Brasil, sendo a Telefe a Globo daqui. A maioria tem criativos nomes: Canal 9, Canal 13... Mar del Plata, apesar de sua relativa importância na província (o equivalente a estado) tem incríveis 2 canais: Canal 8 (que retransmite Telefe) e Canal 10 (retransmite o Canal 13). Minha televisão de 21 polegadas, estéreo, é binária! Se não estiver passando nada de interessante na TV, significa que tenho que conversar com minha mulher, simplesmente inaceitável. Imaginem-se recém chegados a um país, ainda sem dominar bem o idioma e mais ainda o vocabulário local (por exemplo, dizer bonja para se referir a jabón – sabão em espanhol). Na época em que cheguei, passava um programa, algo como uma novela, que tinha uma tremenda audiência. Era ininteligível no começo, porque os personagens eram ruins, os atores, quase todos péssimos, e a história não tinha nem pé nem cabeça (um verdureiro que se torna presidente da maior empresa de publicidade da Argentina, só porque era honesto e bondoso). Havia um travesti interpretado por um... travesti! Enfim, paro por aqui, para que não comecem a sentir pena de mim. Cheguei a sentir saudades da Record, pra que entendam o meu grau de desespero. Do outro canal, nem chegava perto, estava pior ainda. Pra não me sentir completamente fora do Brasil, eles costumam passar muitas novelas brasileiras, mas à tarde: agora está em seu momento decisivo (faz uns dois meses, mais ou menos) “Señora del Destino”. A dublagem me faz rir, não que seja mal feita, mas é que fica com cara de novela mexicana. E se demora um pouco mais a terminar, capaz que chegue até o segundo mandato de FHC. Agora a programação, está um pouco melhor, se bem que pararam de transmitir temporariamente os Simpsons à noite. E é bastante comum um programa durar somente um dia, dependendo do ibope (medido por IBOPE, vejam só). A busca pelo que chamam aqui de rating é muito cruel. Ainda não vi interromperem um programa, tipo série ou novela, no meio do caminho. Mas trocam de horário tanto quanto o Ronaldo se casa. No fim, se você acompanha algum programa, corre o risco de não saber em que horário ele passa. E, sem aviso nenhum, põem um Harry Potter qualquer pra competir com alguma estréia. Eu sei que a TV brasileira não é muito melhor que isso, mas pelo menos tinha a Fórmula 1 sem cortes comerciais e o Campeonato Brasileiro, que são o que realmente me interessavam. Detalhe: aqui, as corridas não passam em TV aberta, tenho que ir ver na casa de meu sogro, que tem TV a cabo. E pensar que eu reclamava tanto da Globo por causa do chato do Galvão Bueno... O irônico disso tudo é que a Bandeirantes agora passa a fabulosa Florisbela, que nada mais é que uma versão de um programa que aqui se chamava Floricienta (para que entendam: Cinderela, em espanhol, é Cenicienta). Como sei disso? Na TV a cabo, há Bandeirantes. Meu sogro costuma sintonizá-la, porque pensa que eu gostaria de ver um pouco, já que é um canal brasileiro. Ele quer ser gentil e não sabe o mal que me faz.

24 de abr. de 2006

Um pouco de história...

Como já disse, vivo em Mar del Plata, Argentina. Mardel, como as pessoas carinhosamente a chamam, está localizada a umas 4 horas de estrada ou 1 hora de avião desde Buenos Aires, e é uma cidade essencialmente turística. Mal comparando, está para Rio, assim como Buenos Aires para São Paulo. Aliás, não acho que seja tão má comparação assim, senão vejamos: Mardel e Rio são cidades de praia, com intenso movimento turístico no verão, principalmente vindos de cidades maiores e pouco contato com a natureza (Buenos Aires e Sampa). Além disso, assim como no Rio, há uma grande quantidade de estrangeiros vivendo em Mar del Plata. Aí, começam as diferenças: basicamente são bolivianos e peruanos vivendo aqui, e muitos “chinos” também. Os chinos, como já devem ter percebido, são chineses e quaisquer outros com feições parecidas a eles. Logo vocês vão se dar conta que o argentino tem a mania de abreviar tudo. Eu sei que no Rio também há muitos estrangeiros vivendo, mas fora alguns peruanos que conheci na Praça Saens Pena, a maioria é de americanos, ingleses e... argentinos! Bem, o fato é que enquanto as pessoas se mudam para o Rio pelo seu charme (ou o que resta dele...) os bolitas, digo, bolivianos, vêm pra cá por trabalho. A maioria vem ilegal e trabalha em negro nas fábricas de pescado, ou seja, o que no Brasil seria sem carteira de trabalho. Observem que eles, em sua maioria, não querem voltar pra Bolívia, hein? Depois, falo mais disso, divago em excesso.

Então, já sabem que a cidade vive do turismo e das fábricas de pescado. Mas e como ela surgiu? Em 1800 e antigamente, um tal de Barão de Mauá, associado a um português, resolveu abrir um saladeiro no que seria então Mar del Plata. Não deu muito certo e o nosso querido Evangelista de Souza se desfez de sua parte. Pouco depois, o português, pra saudar as dívidas, cedeu a sua parte para um dos pioneiros da região, Patricio Peralta Ramos. Esse cara teve a visão de transformar a localidade em povoado, criando um plano para a cidade, ou seja, Mardel não cresceu de maneira desordenada, como em geral acontece. Outro personagem fundamental para a cidade foi Pedro Luro que se fez cargo do saladeiro e outros empreendimentos. Inicialmente, nos lotes foram sendo construídas casas de veraneio, mas com o tempo as pessoas, principalmente de mais idade, começaram a se mudar para a cidade (por causa do mar – lembrem-se que antigamente banhos de mar eram considerados terapêuticos). Até hoje, a cidade tem uma grande população de idosos, somos uma grande Copacabana! Outro dado interessante sobre as origens dos cidadãos atuais é que desde sempre houve italianos (ou “tanos”), aumentando ainda mais durante a Segunda Grande Guerra; vieram muitos espanhóis também. Atualmente, além destes todos que já citei, notei que há vários provenientes das antigas repúblicas soviéticas. Não me perguntem o porquê. Deve ser uma questão de clima ou fogem da guerra, sei lá. Na próxima que eu vá a Migraciones, vou me animar a perguntar...

Durante o verão, todas as grandes produções teatrais migram para a cidade. Sobra muito pouca coisa em Buenos Aires, já que grande parte das pessoas, principalmente aquela que tem prata pra gastar, está aqui! Verão passado, fui assistir a uma peça chamada Táxi, que na verdade é uma montagem originalmente inglesa. Foi divertida. Chegaram a apresentar uma versão de uma peça de Ingrid Guimarães e Heloísa Perisset, que aqui chamaram Locas de Atar (não me recordo o nome original, alguém sabe?). O triste é que ao final da temporada a cidade se torna mais triste e cinza, já que todo aquele movimento e jogo de luzes dos ônibus que percorrem o centro com crianças e seus pais, homens-aranha e power rangers de araque dão lugar a um deserto de gente, principalmente à noite. Afinal de contas, o outono chega e com ele o frio. É curioso que a cidade não deixa de ser mais bonita por isso, mas trás uma certa melancolia. Admito que às vezes eu gosto disso. Mas a cada feriado largo, a cidade se ilumina de novo: inexoravelmente, se enche de turistas, nem que seja pra ficar três, quatro dias. E com chuva. Bem, pra finalizar, jamais chame a um habitante da cidade de portenho, porque este vem de Buenos Aires e, apesar de trazer grana pra gastar por aqui, não é muito bem visto, na verdade imagino que a má fama que o argentino tem no exterior é culpa dos portenhos. Já me disseram várias vezes que são todos muito presunçosos e chatos. Confesso que já presenciei um par de vezes situações meio estranhas com os portenhos, mas ainda não tenho um juízo definitivo pra dar sobre este assunto. Conheço uns espanhóis tão mal-humorados quanto alguns de Buenos Aires. Pode ser cultural. Com certeza, falarei mais disso no futuro. Por agora, podem me chamar de marplatense.

Pra saber mais:

Estes sítios estão em espanhol, mas não é difícil de entender.

Saludillos!

21 de abr. de 2006

Capítulo 1

Bem-vindos!

Enfim, superei a preguiça de criar um blog como já havia planejado faz tempo, cheguei até a registrar um domínio pra isso, mas atualizar um blog é complicado da maneira tradicional, enfim, descobri meio que por acaso que o blogger é a melhor opção. Então, aqui estou.

Bem, o negócio é o seguinte: sou carioca mas agora vivendo na Argentina, cidade de Mar del Plata, por uma razão que, inclusive, recém veio à tona no O Globo: a violência que tomou conta da cidade. Não sei se alguém aqui soube disso, mas metade da população do Rio sairia da cidade se pudesse. Na verdade, não fico espantado com isso, sempre tive essa impressão, desde o momento em que vários amigos meus foram pra cidades mais ou menos distantes da capital. Também é verdade que alguns foram por motivos profissionais, mas sempre me lembro da felicidade estampada na cara de um ou de outro. Pra ser sincero, queria mesmo era ter feito o mesmo, mas mudar pra outra cidade sem ter um ponto de partida é complicado demais (mesmo tendo apoio já é bem difícil). Daí que viemos (eu, minha esposa e minha gata) pra Mardel, principalmente porque ela sendo originalmente daqui permitiu que tivéssemos todo o apoio necessário para começar de novo. Minha idéia com o blog é contar um pouco sobre o que é ser estrangeiro, especialmente sendo brasileiro na Argentina em uma cidade como Mar del Plata, que muito pouca gente conhece - mesmo depois da Cúpula das Américas. É claro que não deixei de acompanhar o que passa no Brasil e tampouco no mundo, então vou falar de tudo um pouco, obviamente.

Por agora, é isso. Na medida do possível, vou atualizar as entradas. Antes de ir: um super obrigado a meu irmão de alma, Cláudio Bezerra, ele me deu um tremendo incentivo hoje, talvez era o que faltava pra vencer a preguiça.
Abraços a todos. Força sempre!